Os ‘fortes avisos’ de Carlos Tavares, que os políticos da UE têm feito “ouvidos moucos”
Carlos Tavares preocupado com situação política e guerra de preços

Carlos Tavares (PSA Group): um português com toque de Midas

By on 10 Dezembro, 2018

Verdadeiramente impressionante aquilo que Carlos Tavares fez desde que tomou conta do PSA Group, instaurou os programas “Back in the Race” e “Push to Pass” e tirou das mãos da GM o grupo Opel. À beira do abismo, o PSA Group e o Opel Group, são hoje, juntos, o segundo maior construtor europeu.

Não existem adjetivos para o trabalho que Carlos Tavares, ex-COO da Aliança Renault Nissan, fez até ao momento no PSA Group. Anunciado há pouco tempo, o crescimento do lucro face a 2017 ultrapassa os 40% e a margem de lucro operacional é já inveja de todos os construtores europeus. De tal forma que o PSA Group já ultrapassou o Grupo Volkswagen, em setembro, como o maior grupo europeu.

Se puxarmos o filme atrás, até 2012, encontramos o Grupo PSA à beira do abismo depois de anos e anos de prejuízos. Em 2012, o valor final do prejuízo era de 5 mil milhões de euros e tudo foi colocado em causa, nomeadamente, a forma como os responsáveis pelo grupo e a família Peugeot, dona do grupo PSA, se mostravam incapazes de devolver lucro e mais valia aos acionistas. Tudo porque ninguém queria ver a falência do mercado europeu que desde 2008 estava em profunda crise. Ora, centrado no mercado europeu, o negócio do grupo PSA estava em crise e com incapacidade de reduzir custos e perdendo cada vez mais margem operacional, o grupo francês estava estrangulado com um “cash flow” cada vez menor e à beira do abismo.

Com uma previsão de queda, com estrondo, de um dos mais importantes grupos industriais franceses, a família Peugeot aceitou, finalmente, deixar o controlo da companhia. Apelou ao Estado francês e encetou negociações com os chineses da Dongfeng Motor. Ambos acabaram por injetar o dinheiro necessário para financiar a tesouraria do grupo PSA ao comprarem 28% do capital social (14% para cada entidade), obrigaram ao fecho da unidade de produção de Aulnay e ao corte de 8 mil postos de trabalho. O desespero era de tal ordem que a família Peugeot, depois de libertar o controlo do grupo, ainda encetou negociações para que a General Motors comprasse e tomasse conta do grupo francês, através da Opel, marca que perdia dinheiro há anos. O cenário era, verdadeiramente, negro!

O primeiro passo na direção certa foi o financiamento do Estado francês, mas, sobretudo, a ligação à Dongfeng Motor, pois o grupo PSA abriu-se ao oriente e começou a receber os proveitos de vender de forma significativa na China e em outros mercados asiáticos. O segundo passo foi a contratação de Carlos Tavares, livre depois de Carlos Ghosn ter travado a trajetória rumo ao cargo de CEO da Aliança Renault Nissan. Provavelmente, os responsáveis da aliança, se soubessem o que sabem hoje, teriam obrigado Ghosn a sair e tinham retido Tavares. Mas adivinhação é algo que não serve a todos…

Chegado ao grupo PSA, mudou-lhe o nome para PSA Group e instalou, imediatamente, uma nova estratégia denominada “Back in the Race”. Esta nova estratégia desenhava o caminho para a recuperação do PSA Group: reduzir a oferta de modelos dentro da gama de todas as marcas, expansão para fora da Europa e implementação de fortes medidas de redução de custos e maior eficiência de todas as áreas do grupo.

Algumas destas medidas não foram simpáticas e muitos dos “velhos do Restelo” que ainda ocupavam lugares chave dentro do PSA Group, tentaram remar contra a maré de sucesso que se formava, tendo ficado célebre a polémica sobre o vencimento do executivo português, algo que chegou até ao executivo francês.

Indiferente a tudo isso, Carlos Tavares focou-se no trabalho de resgatar o PSA Group e mal implementou a estratégia “Back in the Race” anunciou que iria medir o sucesso das suas ideias através dos valoeres de “cash flow” e de margem operacional libertada. Alguns troçaram, outros encolheram os ombros e ainda outros simplesmente acharam que o português se iria espalhar ao comprido.

Com um prazo de implementação de quatro anos (2014-2018), a estratégia “Back in the race” foi um estrondoso sucesso: no final do primeiro ano de implementação, o PSA Group exibia uma margem operacional de 5% (o objetivo eram 2%) e um luco superior a mil milhões de euros. O primeiro lucro registado pela PSA desde 2010!!! Mas a estratégia fez mais: a produtividade das fábricas do grupo andava nos 65% desde 2010, no final de 2016, estava nos 90%. O “cash flow” subiu de forma incrível e os prejuízos transformaram-se em lucro. Contas feitas, no final de 2016, dois anos antes do prazo dado pela estratégia “Back in the Race”, todos os objetivos foram alcançados!

Estava na hora de entrar em ação a segunda fase da recuperação com o plano “Push to Pass”. O novo plano tinha o foco no lucro, começando de uma base de 5% de margem de lucro operacional (a inveja de todos os construtores europeus), e aprofundar, ainda mais, a redução de custos. Além disso, o “Push to Pass” incluiu o investimento massivo na marca DS (que lançou o primeiro carro não Citroen com o DS7 Crossback) para a diferenciar da Citroen e torna-la como a marca Premium do grupo, a revitalização com produtos á sua imagem da Citroen e fazer regressar a Peugeot às suas raízes. Apostar forte nos segmentos mais valiosos como os SUV e, mais recentemente, prioridade à eletrificação da gama – mesmo que Carlos Tavares seja um cético sobre este assunto – onde o PSA Group está atrasado.

Mas para que o “Push to Pass” fosse um sucesso, Carlos Tavares precisava de produto que fosse bem acolhido pelos consumidores e mais músculo. Como excelente gestor que é, o português tinha tudo pensado: aprovou o lançamento dos Peugeot 3008 e 5008, imediatos sucessos de vendas, mesmo que com preços acima dos rivais, o Citroen C3 que fez regressar muitos clientes da marca e a DS lançou o primeiro carro não Citroen, o DS7 Crossback. Não estranhou que no final de 2017, o PSA Group tenha anunciado volumes de vendas, lucros e margem operacional recordistas: 3,63 milhões de veículos vendidos, 1,56 mil milhões de euros de “cash flow”, 3,991 mil milhões de euros de lucro e 7,1% de margem operacional.

A cereja no topo do bolo foi a compra do grupo Opel à General Motors. Recordamos que apenas quatro anos antes, o grupo PSA estendia a mão à GM para que esta entrasse no capital do grupo. Carlos Tavares viu a oportunidade para ganhar músculo e resgatou a Opel e a divisão britânica Vauxhall. Uma inversão dos papéis que acabou com Tavares a implementar o programa “PACE!” para a recuperação da Opel.

E depois de anos a perder dinheiro, a Opel, no primeiro ano dentro do PSA Group, regressou aos lucros e contribuiu para o excelente resultado do grupo francês. Tudo nas barbas dos mais incrédulos que afirmaram ser a compra da Opel um erro dramático.

Pois bem, o plano “PACE!” reduziu de forma dramática os custos, agilizou procedimentos e no final dos primeiros seis meses de 2018, o lucro operacional é de 502 milhões de euros e suas vendas e excelente performance comercial, permitiu que o lucro do PSA Group tenha subido 40% e permitido, em setembro, o PSA Group seja o segundo maior grupo europeu atrás do grupo VW.

O toque de Midas de Carlos Tavares tem deixado os observadores boquiabertos, mas o caminho não será sempre uma auto estrada: o PSA Group está a perder terreno no mercado chinês – que cada vez mais se mostra uma caixinha de surpresas com grande volatilidade – está atrasado no que toca á eletrificação e necessita de encontrar respostas para alguns modelos chave em termos de vendas e completar gamas para incrementar o lucro. Será Carlos Tavares capaz de manter o ritmo do “Push to Pass!”? Sentado em lucros e margens operacionais fantásticas, Carlos Tavares só terá de usar o seu “toque de Midas” para que o PSA Group seja cada vez mais um “case study” da indústria automóvel mundial.

Ensaios: consulte os testes aos novos carros feitos pelos jornalistas do Auto+ (Clique AQUI)